A experiência com agrofloresta em SC que fez ressurgir o açaí catarinense

    Alternativa para a exploração da terra sem os impactos negativos nos recursos naturais, o sistema agroflorestal (SAF) alia benefícios econômicos e ecológicos ao cultivar produtos na agricultura e realizar a manutenção da mata nativa. Em Santa Catarina, a agrofloresta possibilitou a sobrevivência da palmeira Juçara, até então em extinção, junto ao retorno financeiro, com a extração do açaí por agricultores do litoral e do Vale do Itajaí. O sistema ainda permite a restauração de áreas desmatadas e sua biodiversidade, podendo aumentar a produção de alimentos.

    O sistema agroflorestal junta a agricultura com a forma que a natureza age, cultivando a produção de alimentos a partir das características do local, como solo, disponibilidade de luz e clima. Diferente das monoculturas, que substituem a vegetação original para a produção de apenas um tipo de produto, gerando impactos negativos ao solo e ao meio ambiente, as agroflorestas preservam a biodiversidade e aliam o plantio de produtos em uma única área. Ou seja, de forma sustentável, a agrofloresta pode potencializar a produção, preservar o solo e proteger a fauna e a flora simultaneamente.

    A biodiversidade pode aumentar a produção de alimentos nas agroflorestas e contribuir com a restauração florestal nos primeiros anos do sistema, como mostra uma pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) na Fazenda Experimental da Ressacada, no Sul da ilha. O pesquisador Diego dos Santos explica que estudos recentes sugerem que a diversidade funcional está relacionada com as funções de diferentes espécies nos ecossistemas, por isso a mistura de plantas com características complementares pode proteger o solo e reduzir as plantas espontâneas (que competem por recursos como água, luz e nutrientes).

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    “Em outras palavras, se misturarmos plantas com características complementares, protegemos melhor o solo, reduzimos plantas espontâneas e aumentamos a produtividade das culturas, sem uso de agrotóxicos”, sintetiza o pesquisador.

    Agroflorestas em Santa Catarina

    O cultivo agroflorestal em Santa Catarina também permitiu a preservação da palmeira Juçara, que estava ameaçada de extinção por conta de sua intensa exploração desde a década de 1960 para obtenção de palmito. Hoje, o corte da Juçara é proibido e o açaí fruto da palmeira gera renda para agricultores do litoral e do Vale do Itajaí, sem comprometer a biodiversidade e sobrevivência da espécie na agrofloresta. O pesquisador Fábio Zambonim, da Epagri, explica que a espécie não rebrota, por isso a planta morre com a extração do palmito, diferente da colheita do açaí, que não prejudica a espécie e pode ser colhido anualmente, gerando mais renda que o próprio palmito. A Epagri, em parceria com a UFSC, desenvolve pesquisas para viabilizar a expansão de pomares agroflorestais da Juçara em SC.

    Atualmente, a atividade se concentra nas cidades de São Pedro de Alcântara, Palhoça, Paulo Lopes, Biguaçu, Antônio Carlos, Joinville, Garuva, Jaraguá do Sul, Itajaí, Blumenau, Atalanta, Urussanga e Praia Grande. Não há um acompanhamento sistemático da área plantada, mas um levantamento de 2012 estimou a produção de 300 toneladas de frutos anuais, o que representa 150 toneladas do açaí, com cerca de 150 famílias envolvidas direta ou indiretamente. “Em SC pode-se adquirir o produto diretamente nas agroindústrias ou em feiras artesanais. A atividade tem um enorme potencial de crescimento no estado, uma vez que a o açaí consumido em SC é majoritariamente importado da região norte do país”, explica Zambonim.

    Mudas verdes com folhas compridas da palmeira Juçara que produz açaí, em propriedade com sistema de agrofloresta em São Pedro de Alcântara, em Santa Catarina (SC)
    Mudas da palmeira Juçara, que produz o açaí, em propriedade com sistema de agrofloresta em São Pedro de Alcântara – Epagri/Divulgação/CSC

    Outro estudo da Epagri aponta ainda o potencial produtivo do café especial arábica no litoral catarinense, que pode ser cultivado em agroflorestas para restauração e uso econômico de áreas de preservação permanente em propriedades rurais.

    Com o uso sustentável dos recursos naturais, o sistema agroflorestal é uma alternativa para a agricultura familiar, com uma colheita de produtos variados ao longo do ano. Ainda assim, a implantação das agroflorestas pode ter custos altos, além de demandar um conhecimento técnico maior em relação à variedade da produção.

    Os valores podem variar de acordo com as espécies cultivadas e o tamanho do espaço. Um estudo da Embrapa de 2014 em uma fazenda experimental de Jaguariúna (SP), por exemplo, avaliou que o custo de implantação do sistema agroflorestal é de R$ 10.372,67 por hectare, considerando custos como mão de obra, máquinas, adubos verdes, entre outros. No experimento foram utilizadas 1.140 mudas de 40 espécies diferentes. Outros levantamentos mais recentes apontam que o investimento em agrofloresta pode dar um retorno de R$1,60 para cada real investido.

    Políticas de incentivo

    Na Câmara dos Deputados há um projeto para criar o Programa de Fomento e Desenvolvimento de Sistemas Agroflorestais de Base Agroecológica (Prosaf), instituindo uma política de incentivo aos sistemas agroflorestais com acesso facilitado a crédito, fomento de pesquisas e incentivo à compra pública por parte de estados e municípios. Já em Santa Catarina, um projeto de lei implementou neste ano a inclusão das agroflorestas na política estadual de desenvolvimento rural, buscando parcerias com agricultores e pecuaristas para a implantação do sistema em áreas rurais desmatadas.

    Por Ana Ritti – redacao@correiosc.com.br

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