Ponte Pedro Ivo Campos: descalabros desde o princípio

Uma barra de ferro coloca a Capital e região metropolitana de joelhos pela manutenção, mas faz lembrar também que encrencas sempre foram constantes na terceira ponte

foto de satélite das duas pontes, paralelas
A Colombo Salles e a Pedro Ivo, abaixo - Imagem: Google Earth

A Ponte Pedro Ivo Campos lembrou aos catarinenses nesta quarta-feira (13/2) que a natureza de sua estrutura é a cizânia. Pelo menos em termos de contratos nesses quase 28 anos de história, a serem completados em 8 de março.

A barra que quebrou na junta de dilatação não apenas reduziu à metade os únicos 17 metros de largura que ligam a América do Sul à Ilha da Magia, como principalmente fez ecoar o pedido de manutenção emergente da estrutura.

Há quase três anos, a empresa que venceu o edital para a reforma e manutenção das pontes “segunda e terceira” espera pela definição do edital de contrato para a empresa que fará a supervisão da obra. Foram idas e vindas no documento desse último pregão ao crivo do Tribunal de Contas do Estado, reiterando a escolha por “técnica e preço”.

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Para a reforma e manutenção, ao custo de R$ 29 milhões, foi contratada a Cejen Engenharia, e para a supervisão, ao custo de R$ 1,3 milhão, uma das protagonistas locais da operação Lava Jato, a Engevix.

Tais valores e nomes fantasias, porém, aparecerão mais na história da ponte Pedro Ivo (e Colombo Salles) daqui para a frente. Cabe lembrar de outros valores e outros nomes que fizeram os descalabros na história até pouco tempo atrás, época de sentenças judiciais.

Projeto

Das três ligações rodoviárias Continente – Ilha, a ponte “trêsh” foi a que levou mais tempo para ser construída: nove anos. Isso para pelo menos ser inaugurada – incompleta – sem as passarelas inferiores, até hoje.

A ideia da terceira ligação começou ainda na ditadura, com o então governador Jorge Borhaunsen, passando por outros quatro chefes de executivo, até chegar na inauguração, em 1991, nas mãos de Casildo Maldaner.
Ulysses Guimarães estava na inauguração, ao lado do então governador Maldaner, que assumiu o lugar do titular, Pedro Ivo Campos (a pessoa, não a ponte). Ulysses disse que compareceu por causa da homenagem a Pedro, “nem que fosse a nado”.

O projeto foi feito em cima da irmã Colombo Salles, porém com o vão central de aço para permitir financiamento com o BNDE (atual BNDES). Assim, era necessário contratar uma empresa do ramo de aço, claro.

Construção e superfaturamento

A obra foi de 1982 a 1991. São nesses nove anos de construção uma das raízes dos problemas da Ponte Pedro Ivo Campos, em contratos superfaturados.

A empresa contratada inicialmente para construir a Pedro Ivo foi a Usiminas Mecânica S.A. (Usimec). Logo, a Usimec foi atestada como incapaz tecnicamente para a obra, tanto que subcontratou outra empresa, a Transpavi-Codrasa S.A., transferindo 53% do contrato assinado com o DER (Departamento de Estradas e Rodagem, atual Deinfra), para as obras de concretagem.

Quatro anos depois, em 86, sem o ritmo previsto para as obras, o subcontrato foi transferido para a Ster S.A., cuja acionista majoritária era a própria Transpavi-Codrasa.

Em 1987 veio primeiro pedido de aditivo para a Pedro Ivo, com justificativa pelo momento econômico crítico do Plano Cruzado.

Em março daquele ano, a administração do DER, cujo superintendente era o engenheiro Miguel Rodrigues Orofino, repactuou o contrato com a Usimec em valor aproximado de 400 milhões de cruzados (cerca de R$ 190 milhões atualmente).

Três meses depois, a Usimec e a Ster pediram nova repactuação de preços ao DER, com diversas alegações, que foram acatadas pelo chefe do departamento. Ficou acordado que os serviços remanescentes passaram ao custo aproximado de Cz$ 714 milhões (cerca de R$ 333 milhões atualmente), sendo Cz$ 321 milhões para as chamadas obras civis e Cz$ 393 para as obras metálicas. Porém, o resultado final do recálculo do contrato foi de Cz$ 891 milhões, mais do que o dobro do pedido de revisão de valores.

Terminada a obra, começou a fase judicial. Diversos processos foram abertos a partir de 1991, principalmente por proposições de ações civis públicas do MPSC contra 15 réus ao total. Alguns desses processos aguardam sentença até hoje.

Mas já em 1991, o engenheiro Orofino e a construtora foram condenados a ressarcir o Estado de Santa Catarina em função de gastos indevidos com aditivos e contratação irregular de pessoal.

Com recorrências após recorrências, a decisão final do Superior Tribunal de Justiça só saiu em 2013. Inicialmente se falava em um dano aos cofres públicos de cerca de U$ 27 milhões.

Nesse ínterim, Miguel Orofino chegou a fugir do país em 1992 com uma amante para não prestar depoimento nos processos e em 1997 foi detido. Após os cinco anos foragido, disse que não sabia que era procurado. Ficou pouco mais de três anos na cadeia e em anos mais recentes se isolou no município de Angelina, na Grande Florianópolis.

Fora as histórias na justiça, o cotidiano da Ponte Pedro Ivo Campos desde sua inauguração foi de praticamente abandono, em termos de manutenção. Foram apenas pequenos reparos, nova pintura e iluminação.

Há mais de década que se fala em uma manutenção e reforma condizentes, frente à deterioração constante da estrutura. Em 2006, por exemplo, um relatório do Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva) sobre a Pedro Ivo afirmava que a situação da ponte era de “estrutura metálica oxidada e com problemas de ferrugem em juntas exigem reparos”. Desde então, nada foi feito.

barra saliente para cima da junta de dilatação, no meio do asfalto
A barra de ferro que se soltou de junta de dilatação da Ponte Pedro Ivo Campos, nesta quarta (13/2) – Foto: Pista Limpa
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