Repercussão do julgamento de Aranha leva Câmara a aprovar lei que criminaliza omissão de agente público

Projeto é uma resposta à conduta do juiz e do promotor durante o julgamento do empresário André Aranha, acusado de estupro por Mariana Ferrer

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na sessão virtual desta quinta-feira (10), proposta que torna crime a violência institucional, atos ou a omissão de agentes públicos que prejudiquem o atendimento à vítima ou à testemunha de violência (PL 5091/20). A proposta segue para o Senado.

O texto também pune a conduta que cause a “revitimização”. A pena prevista em ambos os casos é de detenção de três meses a um ano e multa.

A relatora, deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), destacou que a violência institucional é grave por ser cometida por autoridades que devem zelar pelos direitos humanos. Ela lembrou o caso Mariana Ferrer, que motivou a apresentação do projeto.

Publicidade

Dorinha alterou a proposta para definir a “revitimização” como discurso ou prática institucional que submeta à vítima ou a testemunha a procedimentos desnecessários, repetitivos, invasivos, que a levem a reviver a situação de violência ou outras situações que gerem sofrimento, estigmatização ou exposição de sua imagem.

Outra mudança determina que a omissão será punida quando a autoridade deveria e poderia agir para evitar a violência.

O texto aprovado também estabelece que não será punido o agente que, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima.

Exposição da vítima

A proposta modifica a Lei de Abuso da Autoridade (13.869/19) e foi apresentada pelas deputadas Soraya Santos (PL-RJ), Flávia Arruda (PL-DF), Margarete Coelho (PP-PI) e Rose Modesto (PSDB-MS) em resposta à conduta de agentes públicos durante o julgamento do empresário André de Camargo Aranha, acusado de estupro por Mariana Ferrer. Ele foi absolvido da acusação de estupro de vulnerável por falta de provas.

Na audiência, cuja gravação em vídeo se tornou pública em novembro passado, a vítima teve sua vida pessoal como modelo repreendida pelo advogado de defesa, sem a intervenção do juiz ou do representante do Ministério Público.

As autoras do projeto destacam as cenas que mostram Mariana Ferrer, desgastada, pedindo por respeito e afirmando que nem o acusado fora tratado de tal maneira e obtendo, como resposta, o consentimento do juiz para “se recompor e tomar uma água”.

printscreen do julgamento de aranha mostra cinco pessoas em cada tela; com mariana com cara de choro na coluna da esqueda em baixo; outros homens acima
Mariana foi humilhada na audiência que definiu a absolvição de André de Camargo Aranha por estupro de vulnerável – Reprodução/CSC

Segundo as parlamentares, tanto o juiz quanto o promotor acompanharam a testemunha ser humilhada e “revitimizada” pelo advogado.

Assim como as autoras do projeto, Professora Dorinha Seabra Rezende disse tratar-se de um típico caso de violência institucional. “Infelizmente, essas condutas são antigas e constantemente utilizadas como tática de defesa pelos patronos de agressores de crimes sexuais”, comentou. “Em vez de se ater aos fatos e à legislação, baseiam-se no comportamento das vítimas e em alegações sexistas para questionar sua índole e moral, justificando os crimes cometidos por seus clientes.”

Ainda segundo Professora Dorinha, o Judiciário deveria ser um ambiente de acolhimento e escuta das vítimas, mas revela-se um campo de humilhações e desestímulo a denúncias. “A violência institucional é ainda maior contra alguns grupos como mulheres, idosos, negros e aqueles de classe econômica mais baixa, refletindo situações históricas de preconceito e discriminação”, complementou.

Publicidade