Dia da Consciência Negra: o Brasil está evoluindo no combate aos crimes de racismo?

O racismo é um sistema de opressão presente na estrutura das sociedades. Se estabelece por meio da criação de uma hierarquia entre os grupos raciais, dando privilégios políticos, econômicos, sociais e simbólicos para um grupo em prejuízo dos demais. Pode também ser definido como um sistema ideológico de hegemonia racial.

No Brasil, racismo teve origem em mais de três séculos de escravidão e por teorias racialistas que fizeram parte da construção da identidade nacional. Após a abolição, a ausência do Estado na integração da população negra por meio do fornecimento de condições materiais e políticas para sua participação em uma sociedade livre levou à sobrevivência da mentalidade e prática escravocrata nas estruturas da república.

Até hoje, esse aspecto da sociedade brasileira ainda está muito presente. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), as taxas de injúria racial e racismo cresceram, respectivamente, 32,3% e 67%, em 2022.

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Em 2021, os registros de injúria racial foram de 10.814 casos e, em 2022, 10.990. A taxa em 2022 ficou em 7,63 a cada 100 mil habitantes. As unidades da federação com as maiores taxas foram Distrito Federal (22,5 casos a cada 100 mil habitantes), Santa Catarina (20,3), e Mato Grosso do Sul (17).

Já os registros de racismo saltaram de 1.464 casos em 2021, para 2.458, em 2022. A taxa nacional em 2022 ficou em 1,66 casos a cada 100 mil habitantes. Os estados com as maiores taxas, de acordo com o anuário, foram: Rondônia (5,8 casos a cada 100 mil habitantes), Amapá (5,2), Sergipe (4,8), Acre (3,3), e Espírito Santo (3,1).

Um caso recente aconteceu no Rio Grande do Sul. Uma pastelaria denunciou uma cliente que exigiu um ”motoboy branco”. Em um dos pedidos, a cliente escreveu no campo de observações do aplicativo: “Última vez veio um motoboy negro, peço a gentileza que mande um branco, não gosto de pessoas assim encostando na minha comida.”

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A legislação brasileira e o combate ao racismo

A Constituição Federal de 1988 afirma em seu artigo 5º, inciso XLII, que o racismo é “crime inafiançável e imprescritível, punível com pena de reclusão nos termos da lei”. O artigo 3º, incisos III e IV, também estabeleceu como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a eliminação das desigualdades sociais e religiosas e a promoção do bem comum, sem distinção de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de discriminação.

Na legislação infraconstitucional, existe a Lei 7.716/89, conhecida como Lei do Racismo, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Segundo Leonardo Pantaleão, especialista em Direito e Processo Penal e sócio do Pantaleão Sociedade de Advogados, o crime de racismo se caracteriza por uma conduta segregadora ou discriminatória de todo um grupo de pessoas que apresentam determinada característica, como raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Segundo a lei, os juízes devem considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.

Já o crime de injúria racial, outra figura existente no ordenamento jurídico brasileiro que tem como objetivo combater o preconceito racial, incluído pela Lei 14.532/23 à Lei do Racismo, trata-se da conduta em que o agente delituoso ofende a dignidade ou o decoro de alguém determinado (ofensa direta a uma única pessoa), em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional, explica Pantaleão.

As penas de ambos os crimes são privativas de liberdade e, por suas características, esses comportamentos não admitem a concessão de finança e não sofrem os efeitos do tempo, são imprescritíveis. “Porém, a pena, por si só, não é capaz de gerar os efeitos desejados, devendo ser somados a ela, políticas educacionais e de conscientização acerca dessa temática, para que tal prática, com o passar do tempo, seja minimizada”, afirma.

Por Leonardo Pantaleão – especialista em Direito e Processo Penal, mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP.

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